Encomenda para uma cigarra

Desde tão jovem me chamas, cigarra
E à tanto recebes apenas fundos de peito

Hoje trago-lhe o que tenho feito

Embrulhado no som de uma guitarra.

Junto à este, amarro o som eterno

do grave que me corta a garganta

Meu sangue em ti agora canta

como arder de uma chama no inverno.

Atravessando ouros e diamantes

cantando teu rumo às planícies

sabes bem que meus tons são tristes

Como separados amantes.

E essas notas que me pediu tão serena

soprando em galhos de esmeralda e seda

Permita que de bom grado lhe conceda

a música mais branda e mais plena.

Deixo numa caixa para ti

com um laço e 3 dobras brilhantes

Meu instrumento mais as notas de antes

Que um dia cantei e existí.

Noturno

Hoje tudo alinha-se à espera

E imóveis minhas pernas tendem complacentes

Do rugir de ária e fera

Dos sonhos e arquiteturas ausentes.

Mas mesmo longe os olhos veem

Onde descansará o rosto e o peito.

No lugar de pausas e suspiros creem

No momento do pulsar perfeito.

Mal sabem as distâncias e os deuses

Que de insistir expresso neste defeito

É que eu bebo do nácar da noite

deste amor rarefeito.

Três

Circulam no tempo os grandes mistérios do céu:
Vastidão, pássaros e as tempestades.

Partindo pelo invisível 

longitudes e janelas amparáveis.
Sítios intervalares.
E no campo da substância: vestes, 
e fragmentos de vozes e águas. 

Entretanto voláteis. 

Não tão absolutos.

A garrafa.
O corpo que habita a alma. 

Não o contrário, a alma é maior.
E a música.

Aberta
Empírico.
Prece:

-Tempestades, vastidão, e pássaros.